Luan Marçal

terça-feira, 2 de junho de 2009

Determinismo

Tem como ser Calvinista e não ser determinista?

Meu Professor de seminário me disse que não podemos adoptar o determinismo, pois isto não é doutrina bíblica. Então perguntei a ele se acontece alguma coisa que Deus não permita, ou que já houvesse sido previamente determinado. E ele ficou quieto.

Porque vejo que algumas pessoas, por mais que se dizem Calvinistas e crêem nos decretos eternos de Deus, terem esta tendência de achar que existe alguma coisa que Deus não tenha determinado ainda?

De.ter.mi.nis.mo (determinar+ismo) Filos Teoria segundo a qual todos os factos são considerados como consequências necessárias de condições antecedentes. D. cultural: teoria pela qual a conduta individual é modelada pelo tipo de sociedade em que vive. D. Psíquico: teoria que afirma que o curso do pensamento e da decisão voluntária é condicionado por certos princípios gerais.

O calvinismo diz que o homem é depravado de tal forma que sua vontade é conduzida por sua natureza pecaminosa. Diz que quando Deus quer salvar o homem Deus o vivifica inclinando sua vontade à Dele. O calvinismo expressa a realidade, e a realidade é que a vontade do homem nunca é livre.

Se por determinismo querem dizer que todas as coisas foram determinadas, ele seria também a realidade de acordo com o Calvinismo. Deus pré-determinou todas as coisas, cada uma delas escrita e determinada quando nenhuma delas havia ainda (Sl. 139.16).

Negar o determinismo é ser arminiano! Contudo, como sempre, devemos definir o que é determinismo. Muitos crêem num determinismo não bíblico, como alguns pagãos, que acham que os factos estão determinados por alguma força da natureza, por alguma maldição da vida passada, etc. Para mim, determinismo bíblico é sinónimo de predestinação...

Infelizmente os ensinos de Calvino são verdadeiramente difundidos. O Calvinismo vai muito além dos cinco pontos, e na realidade afecta toda uma cosmovisão reformada. Minha proposta é reflectirmos sobre até que ponto somos calvinistas de facto. Por exemplo, muitos podem não saber, mas Calvino ensinou que o determinismo é um conjunto de ensinamentos que mostra que Deus está no controle soberano do mundo, realizando sua vontade em e sobre todas suas criaturas.

Seria equivalente dizer que Deus decreta todas as acções e omissões humanas e angelicais, move activamente o coração do homem para realizá-lo e mantém activamente o pecado, administrando-o para sua glória.

Reprovação Activa

Deus em sua Soberania decidiu antes da fundação do mundo os seus eleitos e seus rejeitados, amando os primeiros e odiando os próximos, fazendo menção de que tudo isso seria à parte de obras, ou seja, Deus não escolheu homens de uma massa caída, mas escolheu-os e amou-os antes disso, mas fez com que todos sofressem a acção do pecado.

Além do mais, Deus opera no réprobo o endurecimento, agindo activamente para que ele não se converta, pois isso é para Sua glória.

Deus autor do pecado?

Dizer que Deus predetermina todas as coisas, incluindo o pecado do homens, fá-lo o autor do pecado? Não! Pecado é a desobediência a Deus, e Deus obedece a si mesmo quando predetermina até o pecado dos homens. Deus 'faz todas as coisas segundo o eterno conselho da sua vontade' (Efésios 1:11). Predeterminou a maldade dos irmãos de José para o bem de José; e o pecado destes foi o meio para a bênção que salvaria José.

Deus não é autor do pecado, no sentido efectivo, ou seja, Deus não pode praticar um mal moral... visto que Ele mesmo é santo, e de quem deriva-se todo o conceito de bem ou mal... para que Deus pudesse ser autor de qualquer espécie de "pecado" ou mal moral, deveria existir alguém ou algo superior a Ele, que lhe servisse de ponto de referência moral e ética... Nada nem ninguém está acima de Deus.

Portanto, este tipo de discussão parece mais aquelas pegadinhas escolásticas medievais, em que perguntavam quantas legiões de anjos cabiam na cabeça de um alfinete ou se Deus poderia fazer uma pedrão tão grande que ele não pudesse carregar, ou se ele seria capaz de fazer um círculo quadrado.... Isso são irracionalidades! Fora de cogitação!

Deus não necessita de defensores. Ele não precisa de nada para justificar os Seus actos soberanos neste mundo. Ele é o Criador, o Formador e o Moldador. É o Todo-Poderoso. Por ser todo-poderoso, Deus detém controle absoluto de tudo o que criou. Nada do que Ele faz pode ser injusto — todos os seus actos são rectos. NÃO existe lei capaz de considerá-lo injusto, por ser Ele o legislador.

Ele declarou o fim desde o princípio, e tem realizado, realizou e continuará a realizar toda a sua vontade” (Is 46.10).

Tudo o que acontece neste mundo ocorre apenas porque assim o decretou o Senhor, de acordo com seu beneplácito. Quem reverencia o direito soberano do Senhor, e sua capacidade, de reger toda a criação como lhe apraz não vê necessidade de defender esta proposição. Todavia, existem alguns que afirmam se regozijar na soberania divina absoluta e, no entanto, sentem a necessidade de defendê-lo e justificá-lo perante o mundo.

Desde toda a eternidade, Deus, pelo muito sábio e santo conselho da sua própria vontade, ordenou livre e inalteravelmente tudo quanto acontece, porém de modo que nem Deus é o autor do pecado, nem violentada é a vontade da criatura, nem é tirada a liberdade ou contingência das causas secundárias, antes estabelecidas” (CFW 3,1).

Todos os moradores da terra são por ele reputados em nada; e, segundo a sua vontade, ele opera com o exército do céu e os moradores da terra; não há quem lhe possa deter a mão, nem lhe dizer: Que fazes?” Daniel 4.35

Ou não tem o oleiro poder sobre o barro, para da mesma massa fazer um vaso para honra e outro para desonra ? E que direis se Deus, querendo mostrar a sua ira, e dar a conhecer o seu poder, suportou com muita paciência os vasos da ira, preparados para a perdição; para que também desse a conhecer as riquezas da sua glória nos vasos de misericórdia, que para glória já dantes preparou, os quais somos nós, a quem também chamou, não só dentre os judeus, mas também dentre os gentios?” (Rm 9.21-24 )

Levantaram-se os reis da terra, e as autoridades ajuntaram-se à uma contra o Senhor e contra o seu Ungido; porque verdadeiramente se ajuntaram nesta cidade contra o teu santo Servo Jesus, ao qual ungiste, Herodes e Pôncio Pilatos, com gentios e gente de Israel” (Actos 4.26-27).

"Os teus olhos viram a minha substância ainda informe, e no teu livro foram escritos os dias, sim, todos os dias que foram ordenados para mim, quando ainda não havia nem um deles" (Salmo 139.16).

E sucedia que, quando o espírito mau DA PARTE de Deus vinha sobre Saul, Davi tomava a harpa, e a tocava com a sua mão; então Saul sentia alívio, e se achava melhor, e o espírito mau se retirava dele” (1º Samuel 16.23).

E se o profeta FOR ENGANADO, e falar alguma coisa, EU, O SENHOR, TEREI ENGANADO esse profeta; e estenderei a minha mão contra ele, e destruí-lo-ei do meio do meu povo Israel” (Ezequiel 14.9).

E A IRA do Senhor se tornou a acender contra Israel; e INCITOU a Davi contra eles, dizendo: Vai, numera a Israel e a Judá” (2º Samuel 24.1).

Então disse eu: Ah, Senhor Deus! Verdadeiramente ENGANASTE grandemente a este povo e a Jerusalém, dizendo: Tereis paz; pois a espada penetra-lhe até à alma”. (Jeremias 4.10)

“E por isso Deus lhes enviará a OPERAÇÃO DO ERRO, para que creiam a mentira” (2ª Tessalonicenses 2.11).

Agora, pois, eis que o Senhor pôs o espírito de MENTIRA na boca de todos estes teus profetas, e o Senhor falou o mal contra ti” (1º Reis 22.23).

Soli Deo gloria

5 comentários:

Nuno Fonseca disse...

Ena, supralapsariano, determinista, teonomista! Mas amilenalista? Teonomista que é teonomista é pós-milenista, amigo ;)

Mas a sério, Luan, vim dar-te os parabéns pelo blogue, que mostra uma teologia muito sólida, para o bem do discípulo de Cristo.

Este artigo é necessário, e também abordo estes e outros temas no meu blogue.

Pessoalmente, sigo a resposta de Gordon Clark quanto ao determinismo e autoria do mal: sendo o único mal a desobediência a Deus, Deus nunca faz o mal, pois cumpre sempre o desígnio eterno da sua vontade perfeita. Se esse propósito inclui decretar a Queda e o pecado dos homens e isso é a sua vontade, logo é bom para o fim do seu propósito eterno na glória de Cristo como salvador do pecado. Nem isto desresponsabiliza o homem, pois este mesmo quis pecar de vontade própria. O facto da sua vontade ser determinada por Deus, não o desresponsabiliza, pois não só ele não quis ele obedecer como não quer querer obedecer, e prefere que Deus o haja decretado. Caso assim não fosse, esse homem seria um eleito. Mas repare-se, também, que 'responsabilidade' é a obrigação de 'ter que responder a alguém', o que não se aplica a Deus, que não tem quem quer que seja acima dele.

Vai-se a teodiceia e fica a lógica da Escritura. Deus não é o autor do pecado, mas o autor dos autores do pecado, que predeterminou para o fim da glória de Jesus Cristo, que o venceu na cruz.

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SOLI DEO GLORIA

Nuno Fonseca disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Nuno Fonseca disse...

Mas peço-te cuidado com a tua definição de reprovação, que te aproxima da heresia do hipercalvinismo, irmão. Deus não é tão activo na reprovação como o é na eleição. Na eleição ele transforma o pecador pelo poder do seu amor; mas na reprovação o Senhor não preverte o que já é pervertido; em vez, mostrando o seu amor através do Evangelho e providenciando o favor comum ao réprobo - não produzindo o favor de Deus no réprobo outra coisa que não o ódio deste - o Senhor endurece-o, pela paciência e longanimidade que um inimigo eterno de Deus não compreende e detesta.

Caso contrário, tens um Deus dualista, tão aplicado no amor como no ódio. Mas não é a postura de Romanos 9, que nos mostra um Deus misericordioso para com os vasos de honra e paciente (antónimo de 'activo') para com os réprobos.

Luan Marçal disse...

Nuno, obrigado pela correcção. Sabe, até pouco tempo atrás eu defendia o pós-milenismo, mas graças a Deus eu percebi que o pós-milenismo é incompatível com a sã doutrina.

Muito obrigado pelos parabéns.. tenho que melhorar muito em relação a minha teologia, espero a cada dia tornar mais reformado.

Você defende a graça comum?

Nuno, eu gostaria de indicar alguns artigos para você ler:

http://www.cprf.co.uk/languages/portuguese_graceuncommon.htm

http://www.monergismo.com/textos/problema_do_mal/cheung_autor_pecado.htm


http://www.monergismo.com/textos/problema_do_mal/autor-pecado_wright.pdf

O que o Nuno acha em relação a posição do cheung?

Nuno Fonseca disse...

A ortodoxia, como dizia Chesterton, é uma aventura, Luan.

O meu estudo da escatologia está dividido entre o pós-milenismo, que até Vincent Cheung defende, e o amilenialismo preterista. Talvez pelo meio termo e me torne um amilenialista optimista.

Quanto à graça comum, li já esses artigos. Os proponentes de chamados alto-calvinismo como Hoekseema e Angus Stewart mostram uma objecção sobretudo gramatical: ou seja não negam que Deus mostre favor e até abençoe os réprobos temporalmente, mas que tal não se pode chamar 'amor' nem 'graça', pois serve o endurecimento e condenação dos não-eleitos. Concordo. A questão é que quem defende a graça comum também afirma que tal favor é para deixar o réprobo sem desculpa e evidenciar a sua perdição, assim como demonstra a paciência de Deus.

Em último caso, é um problema de semântica. Pessoalmente, Luan, prefiro deixar Deus falar por ele mesmo. O Senhor usa antropomorfismos, em que afirma não desejar a condenação dos injustos e que deseja a salvação de todos os homens (ainda que não o decrete). Claro que o Deus omnipotente de nada tem carência, logo, em termos absolutos, Deus não deseja nada. Mas, Luan, pelo minha reverência às Escrituras, prefiro aceitar a revelação tal como ela está e deixar o Senhor ter sentimentos. Se é assim que ele se expressa, deixemo-lo fazê-lo, pois quem somos nós para ditar a postura do Altíssimo? Isto vindo de mim, que também já neguei a 'oferta sincera do Evangelho', e o 'amor comum', etc.

Mas enfim, irmão, prefiro não ser demasiado grego - como o já fui - e ser também hebraico. Ou seja, não me ater à verdade da lógica, mas também à relacional. Permitir que Deus demonstre o seu amor, que é um atributo tão importante como a santidade, o ódio do pecado, a justiça, a misericórdia, a soberania - nessa unidade perfeita que é a natureza de Deus.

De novo sobre Cheung: é preciso discernimento. É um cristão muito inteligente. Mas temo que o logocentrismo dele e o seu recurso excessivo à lógica aristotélica possam sobrepor-se à leitura da revelação. A dada altura é de questionar se o uso da nossa dedução e indução deve ser a palavra final para a interpretação da Palavra. Falando objectivamente, não admito que se diga que Deus seja o autor do mal/pecado. Dizê-lo até seria negar o que as Três Formas de Unidade e o que Westminster afirma. O Senhor tem, sim, um propósito no mal/pecado e sim, nunca escolhe ele pecar nem fazer mal, pois o pecado e o mal são a desobediência a Deus, e ele obedece a si mesmo em tudo o que faz. Mas a 'autoria' é a causa directa de algo, e Deus não é causa directa do pecado, nem do mal. É uma cedência que um cristão nunca deve fazer, se questionado.

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SOLI DEO GLORIA

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